quarta-feira, 13 de abril de 2022

Uma estranha planta da Avenida da Paz

 


Uma estranha planta da Avenida da Paz

 

Não me recordo quando, ao passar na Avenida da Paz, reparei nos recortes, nunca vistos antes, das folhas de uma planta que procurei identificar sem sucesso.

 

Com o recurso ao meu amigo Raimundo Quintal, um madeirense que, desde 1983, tem estudado a fitodiversidade dos parques e jardins do nosso arquipélago, nomeadamente os da ilha de São Miguel, fiquei a saber que a planta era uma amoreira-da-china, também conhecida por amoreira-do-papel (Broussonetia papyrifera (L.) L’Hér. ex Vent.).

 

A amoreira-do-papel é uma árvore de folha caduca e dioica pertencente à família Moraceae, nativa da China, Japão, Coreia, Taiwan e Polinésia. Com um crescimento rápido, atinge uma altura que varia entre os 6 e os 15 metros.

 

A amoreira-do-papel, cujo nome específico está associado ao facto de a fibra da casca ser usada na produção de papel de grande qualidade, é utilizada em várias partes do mundo essencialmente como planta ornamental.

 

De acordo com algumas fontes, os seus frutos são muito agradáveis ao paladar, podendo ser comidos frescos ou em compotas, tendo propriedades diuréticas. As suas folhas, para além de induzirem a transpiração e evitarem a diarreia, são usadas como cataplasma para combater problemas de pele e associados a picadas de insetos.

 

Na ilha de Fiji a casca da amoreira-do-papel é usada para o fabrico de tecidos que são usados em várias cerimónias tradicionais, que vão do nascimento ao casamento.

 

Identificada a planta, o passo seguinte foi tentar saber a sua abundância na ilha de São Miguel, recorrendo à bibliografia, a pesquisas no campo e ouvindo pessoas amigas que conhecem bem as plantas da nossa terra.

 

Desconhecendo-se a data da sua introdução na ilha de São Miguel, apenas podemos afirmar que a amoreira-do-papel já era conhecida em São Miguel, em 1851, data em que “O Agricultor Micaelesnse”, órgão mensal da Sociedade Promotora da Agricultura Micaelense, publicou um texto intitulado “Broussonetia”. Nele, a dada passo pode-se ler o seguinte: “é uma elegante árvore, da qual crescem prosperamente n’esta Ilha alguns indivíduos”.

 

O texto referido no parágrafo anterior, para além de dar uma explicação sobre o modo como era produzido o papel a partir da casca da amoreira-do-papel, termina com um (quase) apelo à sua plantação na ilha, do seguinte modo: “Quantas árvores que não tem serventia alguma, não roubam o lugar, que poderá ser ocupado por esta, e inúmeras outras árvores de útil préstimo!”

 

No século passado, a amoreira-do-papel não devia ser muita rara nos Açores, pois o Regente Agrícola Silvano Pereira incluiu-a numa listagem das “Principais Plantas Cultivadas e Espontâneas nos Açores”, publicada no Boletim da Comissão Reguladora dos Cereais do Arquipélago dos Açores, nº 18, de 1953.

 

Até ao momento, nenhum dos meus conhecidos indicou a presença da amoreira-do-papel na nossa ilha, pelo que atualmente, para além da planta existente no Pico da Pedra, só conheço uma árvore existente na Fajã de Cima que observei no dia 2 de julho de 2020.

 

Quem introduziu a amoreira-do-papel nos Açores? Quem a plantou e quando no Pico da Pedra?

 

Teófilo Braga

(A Voz, 199, março de 2022)

 

Em memória do professor José Carreiro de Almeida

 


Em memória do professor José Carreiro de Almeida

 

No passado dia 28 de março, faleceu, com 90 anos de idade, no Hospital do Divino Espírito Santo, em Ponta Delgada, o professor José Carreiro de Almeida, natural da freguesia do Pico da Pedra, onde nasceu a 14 de fevereiro de 1932.

 

Não tinha uma proximidade muito grande com o professor Carreiro, mas sempre que nos encontrávamos, no Pico da Pedra ou em Ponta Delgada, nomeadamente na Biblioteca Pública e Arquivo Regional de Ponta Delgada e algumas vezes no Jardim José do Canto, onde ele por mais de uma vez participou em visitas guiadas pelo meu amigo Raimundo Quintal, era muito simpático comigo e conversávamos um pouco.

 

Como o seu falecimento passou (quase) despercebido entre nós, decidi homenageá-lo através deste modesto e incompleto texto biográfico.

 

Depois de ter frequentado a escola primária no Pico da Pedra, onde completou a quarta classe, esteve quatro anos no Seminário, tendo desistido por doença. Para concluir o antigo quinto ano de escolaridade (hoje nono ano), frequentou um colégio em Ponta Delgada que era dirigido pelo vila-franquense Afonso Borges. A seguir, durante dois anos, frequentou o Magistério Primário, onde se formou como professor.

 

Profissionalmente, o professor Carreiro teve uma carreira longa, tendo lecionado durante 40 anos, 27 dos quais na formação de professores no Magistério Primário de Ponta Delgada.

 

A sua experiência de lecionação começou numa escola na freguesia de São José, situada no lado Sul do Campo de São Francisco, passou pelos Fenais da Luz, onde permaneceu durante 6 anos, e pela Fajã de Baixo, antes de ir ensinar Didática na Escola do Magistério Primário de Ponta Delgada.

 

Sobre o seu pensamento acerca do ensino e da profissão de professor, recordo as suas palavras, publicadas no livro intitulado “Folheai e Recordai”, relativo ao curso de 1972-1974 do Magistério Primário, que são também recomendações aos novos professores:

 

“Há já centenas de crianças que esperam por vós. Amai-as; amai-as muito, porque o amor é o segredo, a pedra de toque que vos ajudará a compreendê-las e a torná-las “elas mesmas”.

Não vos esqueçais também de que o êxito da vossa atuação pedagógica está na medida em que colaborardes uns com os outros: “É melhor haver cinco educadores medíocres, trabalhando em verdadeiro espírito de cooperação do que dez bons pedagogos isoladamente”.

 

Quer durante o período em que lecionou, quer depois, o professor Carreiro foi Guia de Turismo. Numa entrevista dada ao jornalista João Paz, publicada no Correio dos Açores, ele referiu que se preparava muito para desempenhar bem o seu trabalho, tendo afirmado o seguinte: “Nós, ao ensinarmos, crianças de uma maneira muito especial, temos muito cuidado em preparar a mensagem que lhes vamos transmitir para que eles compreendam. E levei este hábito para o turismo, explicava tudo muito bem …”.

 

Benemérito, o professor Carreiro, doou a menina dos seus olhos, um prédio que possuía junto à igreja de Nossa Senhora dos Prazeres, no Pico da Pedra, com o objetivo de lá ser construído um lar de idosos, com uma única condição, a de que ao edifício fosse dado o nome de seu pai, Manuel de Almeida Moniz.

 

Ele e a irmã, Maria Luísa Carreiro de Almeida ofereceram, no passado dia 9 de junho de 2021, uma nova ambulância, dedicada ao transporte de doentes não urgentes, no valor aproximado de 50 mil euros, à Associação Humanitária dos Bombeiros de Ponta Delgada.

 

Os irmãos Carreiro de Almeida, também, doaram à Junta de Freguesia do Pico da Pedra um terreno, nas Giestas, para a construção do Parque de Atividades “Susana Maria Carreiro Moniz”, obra ainda não realizada, mas que não pode cair no esquecimento. O espaço deverá merecer, por parte da Junta de Freguesia do Pico da Pedra, uma atenção especial, tal como a que foi dedicada, pela Câmara Municipal da Ribeira Grande, ao Parque Pedagógico Maria das Mercês Carreiro.

 

Não tendo sido devidamente homenageado em vida, a sua obra devia ficar registada para sempre através de uma placa a colocar na casa onde nasceu.

Teófilo Braga

(Correio dos Açores, 32708, 13 de abril de 2022, p.11)

Fotografia: Eng. Manuel Moniz da Ponte

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